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ENSAIOS

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Organização das Nações Unidas (ONU)

  • Foto do escritor: Juliana Machado
    Juliana Machado
  • 8 de out.
  • 6 min de leitura

Festa da turma ou reunião de condomínio?

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Ouvimos um bocado sobre a ONU esses dias, né?

Eu adoro. Toda vez que chega o momento da reunião da Assembleia Geral, eu fico atenta para checar referências, discursos, novas lideranças. É o que se passa ali que depois entra para os livros de histórias, tenho certeza.


A Assembleia da ONU - pesquisa na Internet
A Assembleia da ONU - pesquisa na Internet

E nessas épocas sempre tem gente surpresa com o fato de o Brasil ser o primeiro a discursar, somos nós que abrimos a reunião sempre. Repararam já? É um desses acontecimentos que vão virando tradição e depois a gente nem se apercebe da relevância dessa preferência.


Tudo é uma questão de contexto, né? E, nesse caso, de muito contexto histórico.

A ONU foi criada em 1945, depois da Segunda Guerra mundial. Todos estavam muito assustados com os horrores da guerra e queriam criar um mecanismo de regulação das relações internacionais a fim de evitar que uma nova guerra como aquela ocorresse. Não foi a primeira tentativa de um organismo assim. Teve a Liga das Nações antes, que fracassou, e os livros sempre fazem referência também à Organização Internacional do Trabalho, que hoje integra a ONU, mas nasceu autônoma e é riquíssima em coisa boa.

A ideia era ser um grande fórum onde os países se encontrariam e conversariam sobre as suas questões, evitando assim o recurso da guerra. Existe uma corrente que estuda isso em política e relações internacionais – é o multilateralismo, ou seja, aquela composição da comunidade internacional que privilegia a comunhão de muitas ideias e muitas forças, em detrimento de grupinhos menores ou hegemonias autoritárias.

Três anos depois, em 1948, a ONU já mostrou que se ocuparia mais de que simplesmente em relação à ausência de guerras. Foi lá que nasceu a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o marco e ainda documento principal na proteção de todas as pessoas. Já escrevi sobre esse processo (na verdade, sobre a condutora dele, mas tá lá).

Mas você acha que é simples convergir os interesses do mundo inteiro para tomar uma decisão conjunta? Claro que não, né? Basta você lembrar da última reunião de condomínio que você participou e pensar quanta discussão rolou só para decidir o que fazer com o barulho que alguns apartamentos ou casas estavam fazendo. Vai ter gente falando que o horário permitia, que nem era tanto barulho assim, que era um evento religioso e não podia ser diferente, que paga as contas então merece ser respeitado e por aí vai.

Na ONU não é diferente, então cada pequeno avanço é na verdade um grande avanço.


Depois da DUDH, que foi feita sem força cogente, foram feitos na década de 60, em plena Guerra Fria, o Pacto dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, esses dois últimos com força cogente já. Depois, a ONU se ocupou dos grupos minoritários e questões mais pontuais. Teve tratados sobre tortura, genocídio, mulheres, preconceitos de toda ordem, questões indígenas, migração, pessoas com deficiência, meio ambiente e clima, nossa, gente... se pensarmos bem é bastante coisa para menos de cem anos de história.

A ONU também traça metas para que os países alcancem os objetivos em todos esses campos, numa conjunção de forças. No momento temos a Agenda 2030. São 17 objetivos e 169 metas para alcançarmos até 2030. Pode ser que não alcancemos tudo? É bem provável que sim, mas ter um plano e uma meta, com compromisso de apresentarmos relatórios periódicos, já facilita todo o processo.

 

Em muitos sentidos, a ONU parece uma festa dos amigos do bairro. Tem muito de símbolos, de imagens, de quem anda com quem, das declarações à imprensa. Nesse ano, por exemplo, quando o primeiro-ministro israelense foi falar, diversos representantes deixaram o ambiente dos discursos, o que demonstrou de maneira clara a insatisfação internacional com a sua condução do conflito com os palestinos (falei conflito, mas nosso presidente chamou de genocídio e eu não consigo discordar, mas não é a questão aqui). Nesse mesmo assunto, uma representante usou um lenço ligado à causa palestina, assim como nossa primeira dama. Achei um protesto chique.

Num outro sentido, a imprensa mostrou amplamente como o Lula foi paparicado por todos. Não temos como saber se foi o tempo todo assim, mas esse é o recado das imagens. Somos queridos. =)


Nosso Presidente e sua gravata lindona - pesquisa na Internet
Nosso Presidente e sua gravata lindona - pesquisa na Internet

Tá certo que o Lula é um presidente bem simpático mesmo, sempre foi, não é novidade. Quem mais andaria de mãos dadas com um presidente francês como se fosse a coisa mais normal do mundo? E vocês lembram no governo passado dele que o Obama disse que ele era “o cara”? Então isso não é assim uma novidade.

E na verdade historicamente o Brasil é um país de muitos amigos, gostamos de conversar com todos, dificilmente abandonamos uma mesa de negociações e acreditamos com força na potência do diálogo e nas decisões consensuais. Nossa diplomacia é admirada e temos tradição de fazê-la com muita qualidade e conteúdo.


E é meio que por tudo isso que somos o primeiro país a falar. Lá no começo da ONU os países aceitaram formar a aliança, mas havia muita desconfiança, a guerra fria estava ali anunciada e não era uma tarefa fácil abrir os trabalhos da assembleia-geral.

Na minha cabeça, eles estavam lá decidindo como seria essa primeira reunião, todo mundo com medo e tal e de repente alguém disse: chama lá aquele pessoal daquele país que todo mundo gosta, aquele que não briga com ninguém e adora conversar! Rs. Aí nos chamaram.

O primeiro grande nome a falar foi o diplomata Oswaldo Aranha, em 1949. Nos anos seguintes a preferência brasileira foi se firmando e a partir de 1955 fomos nós, com raras exceções, que abrimos os trabalhos. Na verdade, quem começa mesmo é o secretário-geral da ONU, depois o presidente da assembleia-geral, aí o Brasil, os Estados Unidos (por serem o país sede) e depois os demais presidentes, em ordem decidida previamente.

E como de bobos não temos nada, aproveitamos a oportunidade para dar nossos recados, passar nossa visão de mundo, o que achamos que deve ser prioridade, críticas também porque somos incrivelmente corajosos na esfera internacional e apostamos no multilateralismo.

 

Foi sempre sempre sempre assim? Claro que não. Tivemos presidentes que não seguiram nossa tradição de riqueza diplomática, de discursos apurados e visão multilateral. Não precisamos ir muito longe para pensar em alguns exemplos, não é mesmo? Mas em regra fazemos bem esse papel de abrir os trabalhos da mais importante organização mundial.

Dessa vez, o Lula conseguiu em um único discurso abordar os ataques do Trump à nossa democracia, questões da América Latina, o meio ambiente, a luta contra a fome, a Palestina. Nesse momento, aliás, ele disse:

Nenhuma situação é mais emblemática do uso desproporcional e ilegal da força do que a da Palestina. Os atentados terroristas perpetrados pelo Hamas são indefensáveis sob qualquer ângulo. Mas nada, absolutamente nada, justifica o genocídio em curso em Gaza.
Ali, sob toneladas de escombros, estão enterradas dezenas de milhares de mulheres e crianças inocentes. Ali também estão sepultados o Direito Internacional Humanitário e o mito da superioridade ética do Ocidente.
Esse massacre não aconteceria sem a cumplicidade dos que poderiam evitá-lo.

Que forte! E que verdade!


A ONU é marcada por esses grandes discursos.

Foi lá que em 1964, Che Guevara disse “O imperialismo nos ataca, mas seguimos firmes”.

Em 1974, Yasser Arafat, líder palestino, disse algo como “Trago uma arma em uma mão e um ramo de oliveira na outra. Não deixem que o ramo de oliveira caia da minha mão”. Bom, parece que esse discurso não ouvimos direito...

Foi lá também que o Nelson Mandela anunciou o fim oficial do regime de apartheid na África do Sul, em 1994 (!).

E, na passagem que eu acho mais interessante dos últimos tempos, a Greta Thumberg disse o famoso “how dare you?” (como vocês ousam, numa tradução livre). Não foi na assembleia-geral, mas na Cúpula sobre Ação Climática, em 2019, sob a direção da ONU também. Menina danada!

 

Viu? É ali que a história é feita e, a cada ano, somos nós que abrimos os trabalhos. Não é pouca coisa e essa plataforma de destaque traz impactos positivos nas nossas vidas cá em terras brasileira, tenham certeza. Dessa vez já ouve até mais apoio para que o Brasil participe como membro permanente do Conselho de Segurança. Viram isso?

Pois é.


Muita gente não compreende a importância da ONU e a sua relevância no mundo atual. De fato, a lista de críticas pertinentes é grande, mas isso não diminui a sua influência positiva nos nossos dias. Basta pensar em como seria o mundo sem esses diversos acordos que são firmados por lá, muitas vezes só pelas aparências. Mas o que começa só com aparências depois se consolida como direito ou costume e depois vira regra obrigatória. E assim a gente vai avançando um pouquinho de cada vez. Tipo e festa de amigos e reunião de condomínio ao mesmo tempo., tudo junto e misturado.

 

Nunca perdi o orgulho de ser brasileira e nem perderei por causa desse ou daquele político. Mas tem horas que o sorriso fica maior no rosto. Dá pra ver daí? =D


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Obs. 1: Tem outras razões para sermos os primeiros. Dizem uns que a gente se voluntariou. Tipo “me chama, me chama”! Tem também quem diga que foi quase um prêmio de consolação, porque não entramos para o grupo de membros permanentes do Conselho de Segurança, mesmo sendo líderes na América do Sul. Deve ter sido mesmo um pouco de cada coisa, mas eu prefiro a minha versão dos fatos.


Obs. 2: Você pode checar o discurso do Lula nesse link. Vai lá sentir orgulho da gente!


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