Era uma tarde agradável de passeio solitário no shopping. Já testou? Amo. Olho as pessoas indo e vindo, imagino o que buscam, o que conversam, o que as atraem até ali. Tomo um café saboroso, passo numa livraria para olhar lançamentos, muito embora seja adepta à leitura em e-books mesmo, e vou andar pelos corredores sem muito destino.
Uma tarde enfim de tédio profundo e descompromissado, tão raro hoje em dia...
Eis que passo em frente a uma lojinha linda, cheia de roupas coloridas, soltas, leves – bem a minha cara, ou como eu gostaria que fosse. Vou dar uma olhadinha de nada, pensei. Sem compromisso.
Então você que não me conhece nem sabe o que isso significa para mim. É que ir às compras para roupas nunca foi nem simples nem prazeroso. Ao contrário. E hoje ainda tenho um monte de reflexões que faço a cada compra – consumismo, feminismo, meio ambiente, exemplo para as filhas – aff, eu mesma me canso de mim. Mas isso é assunto para outro momento. Aqui só anote que eu me arrisquei e me joguei.
- Boa tarde, senhora. Procura algo em particular?
- Estou só olhando mesmo, obrigada.
- Deseja experimentar alguma coisa? Posso procurar sua numeração.
- Ainda não, obrigada.
- Essa seção está no promoção.
- Entendi, obrigada.
E seguem mais 20 perguntas, todas respondidas mais ou menos sem graça ou paciência por mim. Engraçado como as pessoas às vezes não percebem que educação também é dar espaço.
E eis que a blusinha brilhou diante dos meus olhos. Do nada, ali, em tons de amarelo e laranja, numa profusão de cor e de estilo, com corte, caimento, tecido adoráveis. Fiquei séria, não esperava gostar assim de nada, confesso, desarmada. A vendedora, muito atenta, pulou e me ofereceu a numeração certa para experimentar.
Aceitei. Experimentei. Gostei. Aliás, amei.
- Quanto custa?
- R$ 500,00.
- Tudo isso? Por essa blusinha?
- A gente parcela em 6 vezes.
Eu pisquei, descrente.
E naquele momento de iluminação eu entendi como a economia e a nossa vida financeira estão tão atreladas ao nosso estado mental e psicológico e como todos aqueles que vendem algo usam isso a seu favor, cientes ou não. Por que dividir o valor da blusinha em parcelas obviamente não diminuía o seu valor total – pior, poderia aumentar em razão de juros no parcelamento. Mas na cabeça da vendedora, dividir traria uma dor menor para o meu pobre bolso, ainda que parcelada, e isso me ajudaria a conquistar a blusa e ela a venda. Fazia sentido.
Bom, talvez para ela, que teria dinheiro entrando.
Para mim, que só veria o dinheiro saindo, não havia vantagens. Não para uma blusinha que, sim era linda, mas era uma blusinha, compra de impulso mesmo.
Isso significaria pagar por 6 meses seguidos o mesmo bem e que este bem ao fim do pagamento talvez nem valesse mais o que foi cobrado, já desgastado pelo uso.
Olhei a blusinha sorrindo para mim e finalizei:
- Ainda assim, é cara, né? Obrigada.
Deixei a blusinha com a vendedora e saí, um pouco triste, é verdade, porque ainda assim claro que eu queria comprar a dita cuja. Mas também saí mais leve, por perceber que pelo menos às vezes já consigo ver como as mecânicas do mercado jogam comigo e minhas fragilidades e inseguranças, que fechar os olhos não impede que elas ocorram e como às vezes, por já conseguir ver, já posso também resistir.
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Obs. 1: Era só uma blusinha – compra de impulso mesmo, tá? E não me lembro o valor certo, caso a inflação já esteja fazendo esse valor aqui parecer interessante. E é a minha caminhada, cada um sabe as escolhas que faz (ou deveria).
Obs. 2: Claro que a reflexão sobre parcelamento vai muito além disso e tem muita coisa que ele é necessário e ajuda. Quem sabe um dia ouso escrever sobre isso também?
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