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ENSAIOS

de escrita, culinária, economia e finanças, bem-estar e reflexões sobre parentalidade

Era só um café...

Foto do escritor: Juliana MachadoJuliana Machado

Atualizado: há 5 horas

Ou sobre como mudar o mundo a partir de mim e de um batom vermelho.



“Mamãe, que linda que você está!”

O elogio tão espontâneo da minha bonitinha me pegou desprevenida.


É que eu não estava arrumada de verdade. Eu ia sair para um café com uma amiga. Tinha me arrumado decentemente apenas o suficiente para colocar os pés fora de casa e passado um mínimo de maquiagem para não ser rejeitada pela amiga. Mas tinha um batom vermelho, é fato.


É que para quem já não tinha tanto prazer em se arrumar, saindo de um pós-parto, a quarentena fez um estrago maior do que se supunha... Pijamas, roupas frouxas e desgrenhadas, amamentação e cabelos desarrumados eram a regra. Faltou autocuidado, faltou saúde mental e faltou também recursos de tempo e dinheiro para os tratos mínimos que a gente se acostumou a esperar de uma mulher nos dias de hoje. A pele manchou, a barriga não cedeu, o cabelo embranqueceu e eu, entre mil outras preocupações, me resignei...


Que imagem a minha filha estava formando sobre mim para que uma pequena arrumação se tornasse motivo para um elogio tão gracioso quanto incomum? E que impacto essa ausência de cuidado com a minha aparência teria efeito sobre ela e o seu autoamor? Eu não sabia, ainda não sei, mas passei a refletir.


É que não adianta lutar contra – eu serei durante muito tempo o seu exemplo e referencial... e essa responsabilidade pesa, me consome, mas também me motiva!


A questão da aparência e dos estereótipos femininos foram uma preocupação desde que eu soube que seria mãe de uma menina (hoje duas). Resisti ao furor dos rosas, à avalanche dos glitters, ao apelo dos frufrus e à praticidade dos vestidinhos. Não me entenda mal – amo o rosa e o brilho, elas ficam lindas de todas as cores e todas as roupas! Mas nesse campo eu me esforço para que aqui as escolhas tenham propósito sempre que possível... Então optamos com frequência pelos shorts e camisetas, tons azuis, brincadeiras na lama e na areia. Me esforcei para não ceder e nem ver as limitações e as caixinhas que o mundo impõe ao feminino. Esse é um caminho em constante construção.


Com o tempo pude perceber que muitas dessas opções, que achei que eram só nossas, na verdade eram delas também. E vi isso nos poucos laços que tentei colocar e fracassei, nas saias e sandálias compradas e doadas quase novas, nos carrinhos e brinquedos escolhidos para presentes, nas brincadeiras de super-heróis. Vi também que a maquiagem de maneira lúdica era diversão garantida, que um vestido rodado era a roupa perfeita para passeios e que brincar de família, seja de príncipes e princesas ou não, faz parte da vida de qualquer criança.


Venho então aprendendo que eu posso ser o referencial delas, mas se eu permitir, se eu der espaço, elas se mostram como são e crescem mais livres inclusive da minha referência para serem tudo aquilo que quiserem! E eu não posso desejar algo mais incrível do que isso para o futuro delas!


O X da questão é sempre ele, né? O danado do equilíbrio. Eu quero ensinar a elas o autocuidado, o autoamor, a se admirarem, a se sentirem bonitas do jeito que são. E tem inúmeras formas de fazer isso, mas suspeito que a mais potente e verdadeira seja eu agir assim comigo mesma... Aí eu preciso, senão por mim então por elas, me cuidar, me amar, me admirar. Eu preciso procurar avançar nos caminhos contrários aos estereótipos aos quais me oponho, mais adequados às minhas reflexões de mundo e sociedade, sem que isso signifique deixar de cuidar de mim, de me sentir bonita, de me arrumar mesmo que seja para um café com a amiga. Eu preciso aprender onde ceder e onde resistir.


Mas como? Essa é pergunta que tem gastado meus miolos desde então.

Não tenho respostas. Sigo procurando o meu equilíbrio, por mim e por elas.


Mas comprei um batom vermelho a mais, só por segurança. Vai que, né?

De café em café eu mudo esse mundo - o meu, é claro. O nosso a gente vê depois.

Beijo, te espero para um café!

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